UnB em Greve: uma análise de conjuntura.
Raquel de Almeida Moraes*
A trajetória da política econômica revela que entre 1989, último ano do governo José Sarney, e 1997, já no de Fernando Henrique Cardoso, a adesão do País à política neoliberal do Consenso de Washington, FMI e Banco Mundial, promovendo a flexibilização da economia e relações de trabalho, gerou uma abertura do mercado brasileiro que resultou em um salto de 226% nas importações, ou 60 bilhões de dólares. No mesmo período, as exportações avançaram 54%. Resultado: um buraco recorde na balança comercial, com as importações superando as exportações em 7 bilhões de dólares em 1997. Entre 1995 e 2000, o rombo chegou a 24 bilhões de dólares. O país ficou sem dólares para pagar seus compromissos externos, o governo arrochou toda a economia, via aumento de juros e corte de gastos públicos, criando desemprego em larga escala.
Como se não bastasse o rombo, em setembro de 2005 o Ministério da Fazenda (Minifaz) do governo Lula elabora proposta que sugere um corte de 35% para 10,5% na tarifa máxima consolidada pelo país na Organização Mundial do Comércio (OMC). Para alguns setores, entretanto, os cortes propostos seriam ainda mais severos. No caso da indústria automobilística e fabricantes de autopeças, por exemplo, cujas importações estão sujeitas, hoje, a uma tarifa máxima de 33,31%, passariam a pagar apenas 10,31%. Tal proposta, para o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq), Newton de Melo, é suicida. Em suas palavras: "Estão condenando a indústria nacional à extinção”. O setor de bens de capital, que fabrica máquinas e equipamentos para outras indústrias (ou seja, que produz tecnologia, embutida em novas máquinas e equipamentos industriais), será um dos mais atingidos. (Brasil de Fato, Edição Nº 133, setembro de 2005)
Em todo o mundo, a indústria do petróleo é um setor estratégico, ainda mais em tempos de oferta curta e demanda em elevação, o que exige cautela redobrada dos governos. Entretanto, a proposta de abertura do mercado pelo Ministério da Fazenda atinge setores igualmente sensíveis e estratégicos para a economia brasileira. É brutal a diferença entre o tratamento assegurado pelos governos ricos à sua indústria, e o que faz o governo brasileiro. O Relatório de Desenvolvimento Humano 2005, divulgado há pouco pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), ao tratar de questões relacionadas ao comércio mundial mostra que os países desenvolvidos somente passaram a abrir seus mercados - e ainda assim lenta e gradualmente, ao longo de décadas - depois de terem alcançado um nível de desenvolvimento que lhes assegurava autonomia e poder de decisão sobre seu futuro.
Quanto às relações trabalhistas, contratos flexíveis e por tempo determinado ou parcial passaram a fazer parte do cotidiano dos cidadãos. Isso tudo criou uma insegurança generalizada que contribuiu para piorar as condições de trabalho e reduzir a taxa de sindicalização. A mesma lógica perversa se aplica ao servidor público, pois desde os Governos Collor e FHC somos apontados como os “vilões” da crise. Neste sentido, o professor universitário, que no governo Sarney era considerado como carreira típica de Estado, com vencimentos próximos ao do primeiro escalão do serviço público federal, vem sofrendo grande desvalorização. Hoje, após táticas alterações constitucionais (como a quebra da isonomia salarial entre os Três Poderes), os vencimentos dos docentes doutores são praticamente equivalentes aos da carreira do nível médio do Tribunal de Contas da União.
No fundo, o que está em pauta é o modelo de sociedade brasileira que queremos e como a Universidade Pública se insere na dinâmica internacional do trabalho e da produção do conhecimento científico, tecnológico e cultural. Pela análise de nossa história, saímos da condição de dependência imperfeita do Milagre Econômico dos anos 70, como nos alerta Francisco de Oliveira, para o endividamento, mercantilização e sucateamento crescente das riquezas naturais e humanas sob a Nova Ordem Mundial do Governo Bush, no século XXI.
Diante disso, é preciso dar um basta. Para não morrermos de inanição, nossa categoria reivindica: 18% de reajuste emergencial nos vencimentos; incorporação de todas as gratificações para ativos e aposentados; novos concursos públicos e definição de um plano de carreira digno já!
Doutora em Educação pela Unicamp. Professora do Depto. de Planejamento e Administração da Faculdade de Educação, FE da Universidade de Brasília. Representante da FE no Comando Local da Greve, CLG. Observadora pelo CLG no Comando Nacional do Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior, CNG-ANDES-SN.
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